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Reserva Técnica: entenda a polêmica sobre o recebimento de comissões

Infelizmente, a imagem do Brasil está manchada. É lamentável a que ponto tudo chegou. Atualmente, devido a tantos escândalos, envolvendo principalmente a corrupção, o seu povo tem sido considerado como um “tira vantagens”. Há profissionais premiados com viagens para paraísos fiscais ou prescrevendo produtos mediante o pagamento de propinas. Até mesmo as licitações públicas viraram sinônimo de “acerto por baixo dos panos”. E em relação à área da construção civil isso não seria diferente.

Talvez o enfraquecimento da economia, combinado com a falta de novas vagas e a entrada de milhares de novos arquitetos e engenheiros no mercado, tenha permitido a redução dos seus honorários. Para compensar os ganhos baixos, alguns têm aceitado trabalhar mais do que o necessário, assumindo horas e atividades extras. Outros têm optado por um caminho ainda pior, o de aceitar remunerações por reserva técnica.

+ O que é Reserva Técnica?

Reserva técnica – ou RT – é uma prática que tem crescido muito nos últimos anos. Ela pode até parecer comum, mas, na verdade, é considerada antiética e ilegal. Pode ser traduzida como uma comissão financeira paga por fornecedores e lojistas à arquitetos e engenheiros. Serve para que os mesmos façam a especificação de produtos e serviços junto de clientes da área da construção. Por fim, o profissional recebe uma porcentagem sobre o valor das compras realizadas.

+ Como é feito o acordo entre as partes?

O acordo para o recebimento da reserva técnica é feita do seguinte modo: primeiro, os profissionais reduzem o valor cobrado por cada projeto ou assessoria para atrair novos clientes. Depois, eles fecham uma parceria com lojas de material de construção, de móveis, entre outros. Então, omitem essa informação ao cliente, levando-o a adquirir produtos, por vezes, de menor qualidade. O arquiteto ou engenheiro que indicou leva a comissão.

+ Os problemas gerados pela prática da RT

Muitas pessoas acreditam que dar ou receber a reserva técnica é algo legal, mas não é. Trata-se de um crime! Isso pode ser explicado como uma tentativa simplista de resolver o problema da baixa remuneração. Para não perder clientes ou contratos, os profissionais acabam se submetendo às práticas mais antiéticas, desvalorizando seu trabalho e toda uma classe. E a depreciação de sua imagem abre espaço para a formação de monopólios de empresas e uma concorrência desleal.

“Na verdade, o consenso entre os lojistas é que o ideal é não pagar a comissão. Entende-se que é uma prática irregular. No entanto, o grande problema é que, apesar de configurar uma irregularidade, alguns profissionais ainda fazem uso. Dessa forma alguns lojistas, para garantir suas vendas, também seguem aderindo a RT, mesmo que ela fira a legislação.” – empresário Rogério Lemos, em evento de Talk Show; trecho republicado em reportagem de CAUSC.

“É uma prática condenável, pois induz à perda da independência profissional, avilta os preços dos projetos e, às vezes, engana o consumidor quanto aos reais motivos de escolha de uma marca (…).” – Demetre Basile Anastassakis, presidente do IAB, em reportagem de CAUBR.

Fazer sugestões tendenciosas pode comprometer a qualidade de projetos e execuções de obras, além da qualidade e segurança de vida das pessoas. Os profissionais precisam superar todas essas questões culturais e econômicas, e assumir uma postura mais firme, coerente e honesta quanto as suas negociações.  Não pode mais permitir que seus clientes se sintam – e sejam de fato – enganados. Afinal, não adianta o brasileiro exigir uma limpeza política, quando os exemplos de corrupção se fazem presentes desde as camadas mais baixas da sua sociedade.

+ A posição do Conselho de Arquitetura sobre as RTs

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo e o Instituto dos Arquitetos do Brasil são totalmente contra a reserva técnica. Isso fica bem reforçado por resoluções e leis aprovadas que recomendam o repúdio a tal prática de substituir ou complementar os honorários com comissões e percentuais sobre o valor de mobiliário e materiais da construção civil. O profissional que descumpri-las responderá, primeiramente, a um processo administrativo. Provavelmente, ele terá, no mínimo, sua licença cassada. Depois, ainda precisará prestar contas à justiça.

Veja o que diz o Código de Ética e Disciplina do CAU/BR, que regula o exercício da Arquitetura e Urbanismo no Brasil, através da Resolução nº 52, de 2013:

“O arquiteto e urbanista deve recusar-se a receber, sob qualquer pretexto, qualquer honorário, provento, remuneração, comissão, gratificação, vantagem, retribuição ou presente de qualquer natureza – seja na forma de consultoria, produto, mercadoria ou mão de obra – oferecidos pelos fornecedores de insumos de seus contratantes, conforme o que determina o inciso VI do art. 18 da Lei n°12.378, de 2010.”

 

+ Outro ponto de vista sobre o tema

“Dizer que é uma prática ilícita é reprovável. Este pensamento é demolido através da boa fé e da transparência para com o cliente na declaração de todas as remunerações expostas no contrato. Se existe a autorização do consumidor, game over (fim do jogo).” – advogado Sidney Gonçalves, em reportagem da Revista Exame.

“Cabe às associações de arquitetos e designers de interiores aprovarem essa prática e tornarem a decisão pública para que eticamente todos os profissionais possam segui-la.” – Breno Rivkind, sócio da empresa Brentwood, em reportagem da Revista Exame.

Será que o fato de um profissional ser bem transparente com o cliente acerca de todas as etapas da negociação já é o suficiente para que a reserva técnica seja considerada legalmente aceitável? Regulamentar as RTs seria algo muito difícil, porque para cada setor do mercado, cata tipo de produto ou serviço prestado precisaria de uma regra específica. Na dúvida, basta seguir o teor das leis existentes ou assumir as consequências de suas decisões profissionais. O caminho ideal é a honestidade, e fim.

Fotos: Pixabay. Fontes: Clique ArquiteturaCAUConstrução MercadoEl PaísRevista Exame.


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