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Fracasso ou utopia: as cidades fantasmas na China

Recentemente, o Baidu, um dos maiores motores de busca na internet, apresentou o resultado de uma de suas pesquisas, onde foram identificadas mais de cinquenta ‘cidades fantasmas’ somente na China. Quando se diz que elas são ‘fantasmas’ é porque há uma ausência significativa de moradores permanentes na região. Isto se difere, por exemplo, das cidades litorâneas brasileiras, que possuem uma população do tipo sazonal.  O governo chinês garante que isto é apenas um efeito temporário do mecanismo de modernização adotado pelo país. Porém, o que se vê são diversas zonas rurais, agrícolas, reorganizadas e transformadas rapidamente em metrópoles desabitadas. E alguns estão preocupados em saber se as ‘cidades fantasmas’ na China são realmente um problema.

Pudong, em Xangai, já foi considerada uma 'cidade fantasma'.
Pudong, em Xangai, já foi considerada uma ‘cidade fantasma’.

Em 2010, grandes veículos de comunicação ocidentais alertaram sobre os possíveis problemas desta urbanização planificada e da explosão da bolha imobiliária chinesa. Dois anos antes, a China apresentou um programa de investimentos para superar a recessão mundial, que estava afetando grandes economias, como a norte-americana. Este programa é inspirado em um trabalho realizado por governantes em épocas passadas, que diz que “vamos construir primeiro e eles virão morar aqui depois”. O Estado é dono da terra e este usa a sua venda como um meio de enriquecer o orçamento dos municípios.

Em 1990 o distrito de Pudong, em Xangai, também era considerado uma ‘cidade fantasma’. Hoje, Pudong apresenta cerca de cinco milhões de habitantes. Mas, este exemplo urbanístico tem quase trinta anos. Em Xangai havia mais ofertas de mercado e a forte influência das empresas para o planejamento do seu crescimento. Já as novas ‘cidades fantasmas’ estão abandonadas, justamente, porque a população não vê interesse em se deslocar para um local com a atividade econômica ainda tão insuficiente. Mas o governo chinês garante que vai manter o rumo, pois acredita que o Plano de Urbanização Nacional, implantado atualmente, é o melhor meio de crescimento de um país a um ritmo sustentável.

Algumas 'cidades fantasmas' têm caráter imitativo, como a réplica britânica Thames Town, em Xangai.
Algumas ‘cidades fantasmas’ têm caráter imitativo, como a réplica britânica Thames Town, em Xangai.

+ Ordos e o Distrito de Kangbashi

Ordos é uma das maiores cidades da Região Autônoma da Mongólia Interior. Mesmo próxima ao deserto, possui a segunda maior renda per capta da China, ficando atrás apenas de Xangai. A principal diferença entre as duas cidades é que Ordos possui áreas quase que completamente vazias. No início deste século, após o descobrimento de carvão, gás natural e metais raros em sua terra, brotou certo interesse nos industriários pela região. O governo local, então, decidiu transformar a ‘Velha Ordos’ em uma “nova Dubai”.

Em 2000 surgiu a ‘Nova Ordos’, à apenas alguns quilômetros ao sul da cidade antiga. O plano era atrair, rapidamente, mais de um milhão de pessoas para um local novo e mais abundante de água. Os projetos ousados para as obras públicas de Ordos fariam desta a cidade mais futurista de todas as cidades-estados do país.  Seria um grande polo cultural, político e econômico.

A arquitetura da Ordos Opera, em Kangbashi, lembra a arte tradicional Mongol.
A arquitetura da Ordos Opera, em Kangbashi, lembra a arte tradicional Mongol.
O belo edifício do Ordos Airport mostra que a há uma grande expectativa de receber, no futuro, muito mais visitantes.
O belo edifício do Ordos Airport mostra que a há uma grande expectativa de receber, no futuro, muito mais visitantes.

À margem norte do rio Wulan Mulun, foi construído, do zero, o distrito de Kangbachi, uma das novas áreas de Ordos. Repleta de obras arquitetônicas monumentais e muitos outros espaços ao ar livre, alguns já finalizados e outros ainda inacabados, a zona mais parece, hoje, um cenário para filmes de estórias apocalípticas. Em sua paisagem urbana, em maioria simétrica, vê-se o Ordos Art Museum – projeto de MAD Architects; a praça Gengis Khan, o Teatro Kangbashi, a biblioteca municipal e o grandioso Aeroporto Eerduosi. Toda uma área imensa, completa, construída com o dinheiro do governo e quase vazia. Apenas dois por cento dos seus belos edifícios residenciais e comerciais estão atualmente preenchidos.

O Ordos Art & City Museum possui uma geometria bem arrojada, que contrapõe com o rigor originalmente proposto.
O Ordos Art & City Museum possui uma geometria bem arrojada, que contrapõe com o rigor originalmente proposto.
Sob a forma abstrata do museu, as galerias e salas já contam com peças em exposição.
Sob a forma abstrata do museu, as galerias e salas já contam com peças em exposição.

Muitos se perguntam o porquê de tão poucas pessoas terem encontrado motivos para se mudar para a região de Kangbashi. Em primeiro lugar, prazos não foram cumpridos e empréstimos não foram pagos e isto fez com que muitos investidores desistissem. Em segundo, quem poderia explorar o carvão, e outros minérios existentes ali, já moravam na região antiga de Ordos e não viam motivos para gastar dinheiro indo para uma localidade tão próxima. Por último, talvez a causa principal, o preço dos imóveis em Kangbashi é muito alto, o que espanta possíveis compradores.  Enquanto isso, o sonho de uma Ordos mais próspera e habitada fica distante. Há aqueles que acreditam que os habitantes para Kangbashi e outras ‘cidades fantasmas’ logo virão, mas se este tipo de urbanismo é um fracasso ou uma utopia, só o tempo dirá.

Fontes: Arch Daily, BBCAljazeeraCasa VogueRevista Time.