
Como as tragédias em Londres e Lisboa ajudaram a moldar a arquitetura dessas cidades
Em 2016, os ingleses se reuniram às margens do rio Tâmisa para assistir a queima de uma grande maquete. A fogueira fez parte do “London’s Burning”, que é um festival realizado todos os anos para lembrar um dos momentos mais tristes da história européia. Esse ano foi especial porque completou 350 anos da tragédia. Os pequenos edifícios, colocados sobre a balsa, eram uma réplica da antiga cidade arrasada. A obra serviu para ilustrar o acontecimento que marcou drasticamente o século XVII.
Outra cidade muito antiga e importante do continente é Lisboa. Quase cem anos depois do ocorrido em Londres, a capital de Portugal sofreu três grandes desastres em uma mesma semana. Não há fatos precedentes que se comparem ao ocorrido. Terremoto, maremoto, tsunami, ondas réplicas e, posteriormente, um incêndio consumiram cerca de quinze por cento da população total da cidade, além de boa parte do ser território. Em meio ao caos, líderes políticos, arquitetos e engenheiros tiveram de repensar suas ideias e se adequar a novas técnicas construtivas e empregos de materiais. Foi o momento de testar novos modelos urbanos e criar edifícios mais resistentes e seguros.

+ O Grande Incêndio de Londres
Foi no raiar de um dia quente de verão, no ano de 1666, que se deu uma das maiores tragédias da Europa. Na padaria do rei Charles II, em Pudding Lane – que fica próxima a ponte de Londres – o padeiro Thomas Farrinor descuidou-se e deu início a um incêndio de proporções inimagináveis. O fato marcaria profundamente a história da Inglaterra.
Do forno, que não havia sido apagado adequadamente, se espalhou as chamas que queimaram rapidamente a cidade. As ruas eram estreitas e as casas medievais – feitas em madeira de carvalho recoberta com alcatrão, para combater a ação a umidade, totalmente coladas umas às outras. Muitas lojas vizinhas guardavam combustíveis e outros produtos inflamáveis. Para piorar, ventava muito naquele dia. Portanto, não demorou muito para que mais de quarto quintos da cidade, ou cento e oitenta hectares, estivessem destruídos.

+ As consequências do desastre
Após quatro dias, a velha Londres medieval, cercada por muralhas romanas, estava em cinzas. Os métodos de combate a incêndios, daquela época, consistiam em brigadas de vizinhos, baldes e mangueiras manuais. Isso foi insuficiente. Cerca de treze mil casas, noventa igrejas e incontáveis edifícios públicos foram destruídos. Muitos outros foram postos abaixo, na tentativa de bloquear a ação do fogo. Estima-se que apenas seis pessoas tenham morrido e que cem mil tenham ficado desabrigadas. Mas, esse número pode estar errado, já que muitos pobres não tinham registros e possam não ter tido seus corpos encontrados.

+ Processo de reconstrução
Poucos dias depois do fogo ter sido controlado, o Rei Charles II já tratou de tomar providências para a reconstrução de Londres. Quem ficou sem moradia ele mandou para fora da cidade. Planos ambiciosos foram deixados de lado. Optou-se por seguir basicamente o mesmo traçado urbano de antes da destruição. Para prevenir incêndios assim, nas mesmas proporções do ocorrido em 1666, as ruas foram alargadas e às novas edificações foram erguidas com grossas paredes em tijolos e pedras. A restauração da bela Catedral de Saint Paul ficou a cargo do arquiteto Cristopher Wren.

O vídeo a seguir conta cronologicamente, através do uso de imagens, como foi o Grande Incêndio de Londres, dando uma ideia das dimensões desse triste desastre:
+ O Sismo de Lisboa
Em novembro de 1755, no Dia de Todos os Santos – data celebrada por muitas igrejas, principalmente da religião cristã – milhares de pessoas assistiam às missas quando um forte abalo sísmico deu início a um dos piores desastres naturais da história da Terra. Com 8,9 graus na escala Richter – mais intensidade, inclusive, do que foi sentido no Japão, em 2011 – o tremor teve seu epicentro no Oceano Atlântico, mas foi sentido também em boa parte da península ibérica, na África, na América do Norte, na América Central e até na costa do Brasil. E esse, infelizmente, foi apenas o início.

+ As consequências do desastre
O tremor vindo das profundezas do mar fez surgir, em terra, principalmente nas ruas do centro da cidade, fissuras gigantescas, com até cinco metros. De dentro delas, saíam vapores tóxicos e muita poeira. Já nesse momento, muitas construções foram danificadas. Em poucos minutos, o susto virou pânico. Um tsunami, com onda de vinte metros de altura, invadiu Lisboa e fez submergir completamente o porto e os bairros adentro.
O maremoto foi seguido de múltiplos incêndios. Em muitas residências, velas e lareiras estavam acesas, devido às festividades religiosas. O que ainda estava de pé, após o tremor, queimou e acabou ruindo. O fogo durou pelo menos uns cinco dias. Ao final, somaram-se sessenta mil mortos, mas muito mais, certamente, se perdeu sobre os escombros. Além das perdas humanas, valiosos documentos, referentes à exploração oceânica por Vasco da Gama e Cristóvão Colombo, também acabaram arrasados.


+ Consequências e legado
Portugal não esteve e ainda não está preparado para um desastre nessas proporções. Historicamente, sabe-se que grandes tremores podem ocorrer nessa mesma região a cada duzentos anos, mas ninguém parece se preocupar muito com isso. Mesmos com os tristes exemplos da vizinha Itália, as autoridades portuguesas parecem ignorar a realidade. A única regulamentação antissísmica criada no país surgiu em 1958. E apesar de já ter sido revisada algumas vezes, ainda apresenta muitas falhas.

Três anos depois do desastre de 1755, o rei aprovou e ordenou a reconstrução da cidade – de forma ordenada e retilínea, com avenidas largas e grandes praças. Foi seu Secretário de Estado, o Marquês do Pombal, que assumiu a situação, obrigando todos a trabalharem. Foi estabelecido que os novos prédios deveriam apresentar uma padronização de materiais, de preferência reciclados, mais baratos e que resistiam melhor ao fogo. Essa foi uma boa oportunidade de transformar a medieval e arruinada Lisboa em uma cidade resiliente e moderna – pelo menos para a época.
Talvez o maior legado da reconstrução dessa antiga cidade europeia tenha sido a confecção dos primeiros edifícios mundiais com proteção antissísmica – em parte. A nova técnica consistia em introduzir uma espécie de gaiola em madeira entre paredes de alvenaria. Era uma estrutura tridimensional que deixava a edificação mais resistente, principalmente quanto a incêndios. Lembrava muito o funcionamento do ‘Santo Antônio’ nos carros de corrida. Mas, hoje, esse modelo construtivo já está ultrapassado. É preciso que se faça uma revisão nos edifícios antigos, assim como exigir o cumprimento das normas em novos empreendimentos.
Ou será que é preciso mais uma desgraça para que as coisas venham a mudar, de fato?

O vídeo a seguir apresenta uma animação que simula como foram os instantes vividos pelos habitantes de Lisboa durante o sismo, terremoto e incêndio de 1755:
Fontes: Brasil Escola, R7, Notícias ao Minuto, História de Portugal, Hiper Textual.
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